Todos os dias a DGS lança números, apresenta o relatório da situação mas é preciso saber interpretá-los de acordo com o que se passa no meio médico, senão não passam de números.
O que escrevo é para a população em geral, os cálculos apresentados não pretendem ser dados estatísticos sofisticados, mas sim estar ao alcance de todos para que possam ter uma ideia global do que se passa.
Por exemplo, quando vemos a curva dos Casos Confirmados, sempre a subir, que conclusões se podem tirar? NENHUMAS! Porquê?? Porque essa curva é um somatório, um acumular de todos os casos diários desde o 1º caso... nunca poderá descer!! Pode ficar num planalto na hipótese dos novos casos acabarem. Até lá, todos os dias se acumulam novos positivos, nem que fosse só um mas seria MAIS um. É um gráfico completamente inútil. O mesmo acontece com a curva do total dos óbitos.
Estes dois tipos de dados têm um significado epidemiológico para comparar países MAS, mesmo neste caso, têm que ser correlacionados com a população de cada País.
Por exemplo, de nada serve dizer que o Reino Unido teve até hoje um total de 1.369.318 casos positivos e Portugal 217.301. O que importa é que o Reino Unido tem 20.131/M de habitantes e Portugal tem 21.335/M. Assim concluimos que, situações que à primeira vista podem parecer muito diferentes são, no entanto similares nesta variável. O mesmo não acontece com os óbitos pois no Reino Unido há 764 óbitos/M de habitantes e em Portugal 332/M, temos menos de metade. Porquê? O que se passa com o sistema de saúde do Reino Unido? Porque sabemos que o nosso SNS não está bem...
Vejamos o que se passa com os Casos Activos: Este grupo é constituído por todos os positivos sintomáticos ou assintomáticos depois de retirados os óbitos e os curados. Aqui, a curva do gráfico oscila, subindo ou descendo. Porquê? Porque depende da quantidade de positivos novos em relação à quantidade dos que deixam de ser activos porque sairam (curados ou falecidos). Mas, mesmo a evolução deste gráfico terá pouco valor se não soubermos lê-lo. De nada serve dizer que temos 88.854 Casos Activos se não soubermos especificar em que estado de saúde eles estão.
Vamos analisar: 85.925, a esmagadora maioria 97% está nas suas casas, recuperando de uma infecção ligeira ou mesmo sem qualquer sinal ou sintoma de infecção. Isto é de extrema importância para termos a noção real, a nível da população global, da gravidade da situação.
Aliás a nível mundial, à data de hoje acontece o mesmo, https://www.worldometers.info/coronavirus/#countries
15,479,896 (99%) in Mild Condition
99,448 (1%) Serious or Critical
2.929 estão hospitalizados, 2.514 em enfermaria e 415 em UCI; aqui, também temos que analisar o que se passa para avaliar o grau de gravidade da doença, quando é grave: temos então 14,2% dos hospitalizados nas UCI e isto é preocupante. Mas, para vermos até que ponto é preocupante temos que saber, nos que estão nas UCI, determinados dados que não nos são facultados, como por exemplo
- a distribuição por grupos etários
- as co-morbilidades (será que um determinado doente está na UCI porque a sua doença pré-existente desequilibrou gravemente?)
- e neste momento, no norte do País, se o doente positivo para o SARS-COV-2 não terá sobretudo uma pneumonia por Legionella que, se não existisse, seria só um caso positivo, talvez assintomático?
Como veem, a falta de informação completa pela parte da DGS leva-nos a fazer conjecturas sobre o que se passa.
Vejamos o que se passa com os óbitos: neste caso é importante saber sobretudo quais os grupos etários atingidos e correlacioná-los com os anos anteriores. Aqui a análise parce mais fácil pois temos dados, mas não todos. Temos os dados da SICOeMV e as mortes diárias por grupo etário. Então podemos tirar conclusões: a esmagadora maioria dos óbitos situa-se no grupo etário 80++, mais uma importante percentagem no grupo 70+. Abaixo deste último grupo o número de óbitos diminui substancialmente. Mas falta-nos algo muito importante que é a verdadeira causa da morte. É que, como a Dra. Graça Freitas explicou, e como podem ler nos artigos que escrevi:
- lourdescerolbandeira.eu/dgs-como-se-codificam-obitos
- lourdescerolbandeira.eu/normas-testagem-no-cadaver
a contagem faz-se pela existência de um teste positivo. Conclusão: acabamos por não saber verdadeiramente quantas pessoas são vítimas mortais exclusivamente da COVID. Em relação aos anos anteriores, nos grupos etários mais afectados, não há grande diferença que seja estatisticamente significativa.
Consideremos agora um grupo que não é muito falado, os Recuperados. A partir do momento em que os estudos científicos provaram que a partir do 8º dia de sintomas o material colhido por zaragatoa já dificilmente conseguia desenvolver vírus em culturas, ficou assente que o doente positivo que não tivesse qualquer sintoma poderia ter alta pois já não era susceptível de contagiar as pessoas que o rodeiam. Assim, os doentes recuperados passaram subitamente de uns 300/dia para milhares. No passado dia 14, por exemplo, foram dadas 5.135 altas. Se compararmos com o Nº de novos casos positivos nas mesmas 24h, 2.385, podemos ter uma ideia da gravidade da situação sobretudo nos casos que estão a domicílio.
covidaba.com/../Predicting-infectious-SARS-CoV-2-from-diagnostic-samples
Então, qual a conclusão a tirar de tudo isto??
Temos um Outono Caótico, como escrevi em lourdescerolbandeira.eu/um-outono-caotico, mais ou menos como temos todos os anos quando começa a época da gripe, sobretudo a nível hospitalar, mais preocupante a nível das UCI, não porque o número de casos seja exorbitante (de notar que as percentagens de ocupação se referem às camas reservadas à COVID) mas porque nunca foi prestada a devida atenção ao nosso SNS, porque se dificultou a entrada dos nossos filhos nas Faculdades de Medicina com exigência de notas extremamente altas nos 11º e 12º anos, o mesmo acontecendo nas Escolas Superiores de Enfermagem, além de que as baixas remunerações e mesmo anteriores políticas governamentais incitaram os nossos jovens a emigrar.
"Quando o mar bate na rocha, quem se lixa é o mexilhão" logo a população portuguesa, na qual em 95 a 98% nunca foi detectada doença, é a "culpada" desta situação e obrigada a medidas que destroem empresas, empregos e famílias.