Esta é uma publicação da Juíza, Dra. Florbela Sebastião e Silva
Leiam e reflitam sobre o assunto
ACERCA DO CONSENTIMENTO INFORMADO
Tendo sido publicada notícia no jornal “O Público”, no qual se atribui ao coordenador da “task force” para a vacinação a frase “que não se deve promover o consentimento informado”, penso que poderá ter alguma relevância para este assunto o seguinte quadro legal que (ainda) nos rege:
De acordo com o disposto no nº 1 do artº 156º do Código Penal:
“As pessoas indicadas no artigo 150.º que, em vista das finalidades nele apontadas, realizarem intervenções ou tratamentos sem consentimento do paciente são punidas com pena de prisão até 3 anos ou com pena de multa.”
Sendo que, as “pessoas indicadas no artº 150º (do Código Penal)” e “as finalidades nele apontadas” são:
“Médicos ou outras pessoas legalmente autorizadas, com intenção de prevenir, diagnosticar, debelar ou minorar doença, sofrimento, lesão ou fadiga corporal, ou perturbação mental.”
O consentimento é, assim, um elemento essencial para que uma vacina seja administrada, sendo que, nos termos dos nºs 2 e 3 do artº 38º do Código Penal Português:
“2 - O consentimento pode ser expresso por qualquer meio que traduza uma vontade séria, livre e esclarecida do titular do interesse juridicamente protegido, e pode ser livremente revogado até à execução do facto.
3 - O consentimento só é eficaz se for prestado por quem tiver mais de 16 anos e possuir o discernimento necessário para avaliar o seu sentido e alcance no momento em que o presta.”
Nos termos do artº 26º do Código Penal Português, subordinado à epígrafe “autoria”:
“É punível como autor quem executar o facto, por si mesmo ou por intermédio de outrem, ou tomar parte directa na sua execução, por acordo ou juntamente com outro ou outros, e ainda quem, dolosamente, determinar outra pessoa à prática do facto, desde que haja execução ou começo de execução.”
Parece que certas pessoas se esqueceram do relatório elaborado pela própria ERS – Entidade Reguladora da Saúde – em Maio de 2009, intitulado “Consentimento Informado” que estabeleceu os seguintes critérios e anunciou os seguintes princípios:
“1. O consentimento informado para tratamentos médicos, participação de doentes em ensaios clínicos e projectos de investigação e participação de doentes em acções de formação pré-graduada e pós-graduada é um requisito ético e jurídico fundamental.
2. O consentimento informado é uma manifestação de respeito pelo doente enquanto ser humano. Reflecte, em particular, o direito moral do doente à integridade corporal e à participação nas decisões conducentes à manutenção da sua saúde.
3. O consentimento informado assegura não só a protecção do doente contra a sujeição a tratamentos não desejados, como uma participação activa na definição dos cuidados de saúde a que é sujeito.
4. Para um consentimento informado de qualidade, a comunicação eficaz é fundamental e as instituições devem instaurar mecanismos que a assegurem, não só entre o médico e o doente como também entre os diversos profissionais.
5. O consentimento informado deve ser encarado como um processo contínuo e participado, e não como uma mera assinatura de formulários.
6. O consentimento informado não pode, em circunstância alguma, conflituar com os princípios éticos que regulam a prática médica, e não constitui justificação para que os clínicos deles abdiquem.” – página 2 do Relatório da ERS de 2009.
“Uma das razões fundamentais para a existência de consentimento informado é o respeito pela pessoa.
É hoje um dado adquirido, nas nossas sociedades, que cada um de nós é detentor de um conjunto de princípios e características que o torna um ser único, cuja dignidade passa por poder assumir a sua própria individualidade. A individualidade do ser humano está associada ao conceito de autonomia, que neste âmbito não pode ser dissociada da capacidade de escolha e autodeterminação. Uma vez reconhecido o direito à autonomia, entendida como a capacidade de determinar eticamente a sua forma de vida, seria uma violação ética inaceitável condicionar a sua liberdade de escolha, induzindo escolhas ou recusando a sua participação activa na tomada de decisões que podem afectar o seu futuro.” – páginas 4 e 5 do Relatório da ERS de 2009.